domingo, 27 de outubro de 2013

Reunião da Liaba

Na reunião da Liaba de hoje voltámos ao tema da Santa Cruz para falar do momento religioso e político que se viveu antes e depois da aparição, nomeadamente do cisma que se abateu então em Portugal sobre a Igreja, das figuras mais destacadas do cisma no Arciprestado de Vila do Conde, das expulsões de párocos que então ocorreram (metade foram suspensos ou expulsos), do que se passou em concreto na área da palestra de São Simão da Junqueira (a que Balasar pertencia), etc. Um vendaval sacudiu a diocese desde os alicerces e a Santa Cruz, na sua humildade, era uma luz que brilhava na escuridão.
Lembre-se que o poder político cortou então relações  com a Santa Sé, colocou à frente das dioceses eclesiásticos da sua confiança, fechou os seminários e extinguiu as ordens religiosas.

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Um belíssimo diálogo entre Jesus e a Alexandrina

O diálogo entre Jesus e a Alexandrina que se coloca abaixo decorreu em 2 de Março de 1945, depois de esta reviver a Paixão. É belíssimo. Repare-se também no que Jesus anuncia para o futuro, pois contém um especial motivo de esperança.
 - Minha filha, sol da terra, fogo dos corações, honra e alegria do Céu!
Sol que, com os seus raios brilhantes, aqueces e iluminas toda a humanidade!
Fogo que abrasas e purificas os corações! (sic)
Honra e alegria do Céu, porque, ao ver a tua dor, ao ver o teu martírio, que já lá está escrito agora e por toda a eternidade, alegra-me, honra-me, glorifica-me.
Todo o Céu bendiz o meu santo nome pela vítima imolada, pela vida das vidas, pela vítima das almas.Vim do Céu, minha filha, desci do meu trono divino, vim ao meu palácio, ao meu céu da terra, subi ao trono da minha rainha. Venho da minha glória desabafar contigo as minhas mágoas.
Diz-me, amada minha, queres consolar-me? Queres alegrar o meu divino Coração tão triste? Queres dar-me tudo até a consolação que de Mim devias receber?
Fala-me, fala-me com a tua língua de ouro, o teu coração de fogo.
- Jesus, que me pedireis que eu não Vos dê? Conto sempre com a vossa graça para com ela poder sofrer tudo e dar-Vos tudo o que de mim desejais.
Viva eu sempre na tristeza e na amargura, para Vós, meu Jesus, viverdes só na consolação e na alegria!
- Ó meu anjo da terra, tu falas aqui e o que tu dizes escrevem os anjos no Céu a letras de oiro e pedras preciosas.
Vê o mundo, vê o lodo, vê a lama. A maldade que vai por aí!
Olha como sofre o meu divino Coração. Olha como está ferido.
Já que de tão boa vontade, tão alegremente dás tudo, privo-te da minha alegria, da minha consolação, assim como te privei da consolação e alegria daqueles que te são queridos.
Só receberás o meu conforto para poderes sofrer, para poderes vencer.
Só receberás espinhos, de todos os lados espinhos: foi a visão que te mostrei.
Viverás entre eles e entre eles expirarás.
A tua alma pura romperá por entre eles, voará ao Céu a arder de amor. É um anjo seráfico que voa à sua pátria.
Os teus espinhos não são espinhos que secam, a tua dor cultiva o terreno desse bosque imenso que eu te mostrei; o teu sangue rega-os; são espinhos que brotam, são espinhos que dão rosas.
Que jardim brilhantíssimo deles vai nascer!
O orvalho que sobre esse jardim cai é orvalho de sangue, é maná celeste que vem abrilhantá-las, conservá-las, dar-lhes a vida.
Tu partes para o Céu, mas a tua graça, as tuas virtudes ficam na terra: é perfume que se estende a toda a humanidade.
Tu partes para a Pátria e ficas comigo na Eucaristia: serás a pombinha eucarística que não abandona o seu ninho.
É como a pombinha e pastorinha das almas que te quero pintar nas portinhas e cortinas dos meus sacrários. Assim o quero, minha filha, rainha do mundo, rainha dos corações.
Quero, minha filha, tenho pressa, muita pressa que a tua vida seja conhecida; o mundo necessita disso.
É por ti, através de ti que eu mostro o meu amor, a minha misericórdia, as ânsias que tenho de ver salvas as almas.
Custa tanto o pai castigar o filho que erra e se revolta contra ele! Como não há-de custar ao meu divino Coração imolar, sacrificar a minha filha amada, a minha vítima inocente?
Vê, ó mundo, a minha loucura e amor por ti!
Aqueles que se opõem à minha divina causa, ao que se passa em ti, opõem-se contra Mim, opõem-se à salvação das almas.
Todo o teu martírio é por meu amor, é por amor às almas.
Depressa, depressa a salvar, pelo que opero em ti, o mundo inteiro.
Quando Jesus dizia isto, dos Seus divinos olhos corriam lágrimas com toda a abundância. Eu disse:
- Meu Jesus, quero sofrer só eu e só eu quero chorar. Deixai-me na amargura, na tristeza infinda e ficai Vós numa alegria e consolação completa.
Jesus deixou de chorar, estreitou-me a Ele fortemente e retirou-se. Eu fiquei abraçada à minha cruz, mergulhada na minha dor. 

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Por Maria a Jesus

Pelo P.e Mariano Pinho

Por Maria a Jesus! É o programa de todos os Con­gregados; é o lema de todos os cristãos, o roteiro seguro de todos os predestinados para a eterni­dade! Atraídos por Maria, deram com Jesus; iluminados por Maria, viram-se iluminados por Jesus; alentados por Maria à contrição, à confiança, encontraram-se no oceano das Misericórdias infinitas de Jesus.
É esta a economia divina de Maria: quer-nos muito, mas para Jesus; busca-nos, se andamos fugidos, mas para nos levar a Jesus; deseja e pede-nos o nosso cora­ção, o nosso amor, mas para que mais amemos a Jesus.
É este também o resultado da nossa devoção a Ma­ria Santíssima, se é sincera, se é ardente, se é ilustrada, se é enfim, devoção verdadeira: per Mariam ad Jesum.
Então há de ser este também o resultado principal de todas as nossas práticas marianas durante o mês de Maio, se forem práticas de verdadeira e sólida devoção a Maria.
Todo este mês deve ser um ir crescendo sempre em luz e calor: luz que nos mostre cada vez mais nítida aos olhos da nossa alma, a imagem infinitamente deslum­brante e dulcíssima de Jesus; calor que nos inflame e transforme em serafins de caridade para com o Amor que não é amado, para com o seu Coração Amantíssimo.
Assim será, se o nosso mês de Maio não se limitar só ao afã de andarmos colhendo pelos prados e cantei­ros as melhores rosas e lírios e açucenas para com elas adornarmos o altar da Virgem Pura: faz bem à alma des­cansar a vista sobre um altar de Maria, aformoseado com gosto, com sobriedade, com mimo, pelas florinhas com que Deus Nosso Senhor dá afinal também mimo e en­canto aos nossos prados: — as florinhas, as estrelas e os olhos dos inocentes, diz um autor, são as únicas lembran­ças que na natureza nos ficaram do Paraíso terreal. — Mas flores só — não são devoção a Maria.
Faz bem ao espírito escutar durante o mês de Maio os cânticos escolhidos e religiosos e dignamente executados em louvor da Mãe da Deus: porém música, tão somente, ainda não é devoção a Maria e o mês de Maio que se limitasse apenas a cantos e flores, não nos levaria a Je­sus por Maria.
O mês de Maio, para dar resultado tem que ser um mês de estudo e de oração. 
Mês de estudo. Estudo em que o Mestre é o Divino Espírito Santo e a potência que mais se aplica é a inteligência informada pela fé; estudo, que melhor lhe chamaremos meditação, desta Obra-prima do Criador, a Virgem Imaculada. Ah! e não bastará um mês, porque também não há de bastar uma eternidade, se queremos penetrar, nas grandezas, nos privilégios, no poder e nas misericórdias de Maria!
Mas por pouco que se medite, se é com reverência e humildade e desejo ardente de conhecer tão boa Mãe, logo a nossa inteligência se arrebatará, ao ver que «nada há mais esplêndido do que Aquela a quem o mesmo Di­vino Esplendor escolheu: quid splendidius ea quam Splendor elegit?» como diz Santo Ambrósio. Logo o nosso coração se sentirá prendado e preso da Sua amabilidade de Mãe do Amor Formoso, de Mãe dos pequeninos, de Mãe de Misericórdia. Em Maria condensou Deus tudo o que fora de Si há de amável, de belo e de bom.
Logo finalmente nos veremos impelidos a trabalhar por nos parecermos com tão acabado modelo: quem ao meditá-la tão bela e perfeita e ao lembrar-se que é sua Mãe, não sentirá desejos de se parecer com ela?
Mas quem não adverte que estudar e chegar pela meditação ao conhecimento de Maria é estudar e conhe­cer a Jesus? Quem não vê que imitá-la a Ela é imitar a Jesus? Maria foi quem melhor se pareceu na terra e quem melhor no céu se parece com Jesus; aproximar-se por isso das perfeições de Nossa Senhora, é caminhar para as perfeições de Jesus: per Mariam ad Jesum.
Depois, o mês de Maio há de ser mês de oração. Já o meditar nas grandezas de Maria é orar: a verda­deira meditação ascética é oração. Mas havemos de orar, louvando-a e por Ela ao Criador, vendo «quão grandes coisas operou em Maria o Todo-poderoso; a nossa alma engrandece ao Senhor, e o nosso espírito exulta em Deus nosso Salvador, ao ver a Bondade com que olhou para a humildade da sua servazinha: magnificat anima mea Do­minum et exultavit spiritus meus in Deo salutari meo: quia respexit humilitatem ancillae suae. E à porfia com todas as gerações a proclamamos Bem-aventurada, bendita entre todas as mulheres, toda bela e Imaculada, glória do nosso povo, alegria dos céus e da terra e advogada dos pecadores.
Orar louvando e orar dando graças a Deus por nos ter outorgado tão boa Mãe e dando graças a Maria por tão plenamente se desempenhar dessa sua missão de Mãe.
Orar ainda pedindo: ele há tanto que pedir! A ora­ção é a maior necessidade do género humano, e é tam­bém a nossa omnipotência: «tudo o que pedirdes em meu nome vos será dado» — dizia Jesus, «pedi e recebe­reis». Ele há tanto que pedir! Então peçamos e rece­beremos: só pedindo e pedindo muito, é que o mês de Maria será para nós o mês de graças e de bênçãos.
Então peçamos e receberemos; peçamos para nós e peçamos para os outros. Peçamos pela Igreja e pelo Papa; pelos Bispos e pelo Clero e pelos Religiosos e Religiosas, peçamos pela pátria, pela sociedade e pela família; peçamos pelos adultos e pela juventude de um e outro sexo; peçamos pela infância: ele há tanto que pe­dir! Mas peçamos e receberemos; vamos com confiança ao trono da graça. Vamos a Jesus por Maria, peçamos a Jesus por Maria. Peçamos a Maria que nos mostre a Jesus, agora, pelo conhecimento cada vez mais claro e o amor mais abrasado e depois deste exílio, face a face, para o gozarmos eternamente no Céu: et Jesum benedictum fructum ventris tui nobis post hoc exilium ostende.
Se assim se passar o nosso mês de Maio, dará o resultado de toda a verdadeira e sólida devoção, especial­mente quando essa devoção é devoção a Maria Santís­sima, que é: aproximar-nos, levar-nos a Jesus: per Ma­riam ad Jesum.
M. Pinho (Maio de 1932)

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

A Beata Alexandrina e a Beatificação do P.e Cláudio de la Colombière

Era de esperar que o Mensageiro desse grande realce a S. Margarida Maria Alacoque e ao seu director espiritual, o P.e Cláudio de la Colombiére: com estes é que tinha nascido a devoção da Sagrado Coração.
Em 1929, o P.e Cláudio de la Colombiére foi beatificado e o Mensageiro naturalmente exultou: durante anos (até ao fim de 1932 pelo menos), manteve uma secção sob o título de “Amigos do Sagrado Coração” onde foram publicadas principalmente as biografias do novo beato e da sua dirigida.
Que relação pode ter isto com a Beata Alexandrina?
A secção dos “Amigos do Sagrado Coração” abria com um arranjo pictórico e floral onde se enquadrava, entre outras coisas, o lema “sofrer, calar, amar”. Ora é difícil não estabelecer alguma relação entre este e o convite que a Alexandrina ouviu, repetidas vezes, pelos anos de 1931-1922, asofrer, amar, reparar”.
Quando, em 30 de Julho de 1935, Jesus lhe pede que diligencie para que o mundo seja consagrado a Sua Mãe, evoca S. Margarida.

Assim como pedi a Santa Margarida Maria para ser o mundo consagrado ao meu Divino Coração, assim o peço a ti para que seja consagrado a Ela ( à Sua Mãe) com uma festa solene.

S. Margarida não era uma santa popular. O P.e Pinho tinha adquirido uma imagem dela para a Basílica (ainda muito incompleta) do Sagrado Coração de Jesus e havia outra imagem em Bagunte. Mas não haveria mais nas redondezas.
Não é por isso de modo nenhum de excluir que a Alexandrina conhecesse o nome da santa e algo da sua vida pelo Mensageiro, ainda que indirectamente, isto é, não propriamente por o ler, mas por ouvir falar sobre ele ao tempo da beatificação do hoje S. Cláudio la Colombière.
Imagens: 
Em cima, Beato la Colombière segundo imagem publicada no Mensageiro.
A meio, fragmento duma página do Mensageiro onde se pode ver o lema "sofrer, calar amar".
Em baixo, conjunto escultórico da Basílica do Sagrado Coração de Jesus, na Póvoa de Varzim, que representa uma aparição do Sagrado Coração a S. Margarida Maria Alacoque.

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Palestra sobre a Beata Alexandrina

Amanhã, dia 17, o Eng.º Luís Pizarro de Castro, da LIABA, falará da Beata Alexandrina  na Capela da "Obra de Nossa Senhora da Purificação", na Portela de Sacavém.

terça-feira, 15 de outubro de 2013

Os últimos anos d’O Apóstolo e a Beata Alexandrina - 1

Conheceria a Beata Alexandrina a revista O Apóstolo, que os jesuítas publicavam na Póvoa de Varzim? Ela fornecia informação que parece indispensável para a tomada da extraordinária decisão, ocorrida talvez em 1928, de se oferecer como vítima:

Sem saber como, ofereci-me a Nosso Senhor como vítima, e vinha, desde há muito tempo, a pedir o amor ao sofrimento.

“Sem saber como” deve corresponder a por inspiração, mas ela sabia em que consistia oferecer-se como vítima, o que não era comum.
Ora O Apóstolo, por essa altura, falava mensalmente da reparação e de cristãos que se ofereciam como vítimas pela salvação da humanidade.
Além disso, em Balasar, desde 2 de Julho de 1893 (tempos do P.e Sousa), havia a Associação do Coração de Jesus, o que torna provável que a revista aí fosse conhecida. A Sãozinha, a Deolinda e a Alexandrina foram membros da associação.
Há uma acta da reunião dos Zeladores e Zeladoras da Associação do Sagrado Coração de Jesus, de 1933, a que presidiu o P.e Manuel de Araújo, mas a poucos meses de deixar a paróquia, onde se valoriza a frase evangélica “Deixai vir a Mim as criancinhas!” A reunião foi secretariada pela Prof.ª Maria da Conceição Proença, a Sãozinha.
Ora esta frase não é só uma citação do Evangelho, é também citação da Cruzada, que lhe deu grande destaque na capa de números sucessivos.
Isto quase garante que a Cruzada e certamente o Mensageiro eram recebidos na freguesia, que a Sãozinha os conhecia e que a Alexandrina deles ouviria falar com insistência. Estas revistas sucederam a O Apóstolo e continuaram-no.
Na mesma acta é referido o tema da reparação – da Comunhão reparadora.
Noutra acta encontrámos a expressão deste desejo: “Oh, quem dera que Portugal do século XX fosse o Portugal dos nossos avós! Que costumes tão santos se respeitavam!...
Mas ainda bem que um movimento geral se está operando no sentido de levantar a nossa Pátria!”
Estas frases sintonizam também com o que se vê nas referidas revistas jesuítas.
Bandeira da Associação do Sagrado Coração de Jesus fotografada no Cemitério de Balasar. Esta associação completou 120 anos em Julho de 2013 e foi criada pelo pároco que baptizou a Beata, que está sepultado no jazigo cujo cimo se vê ao lado direito da bandeira.

O que era O Apóstolo?

Os Jesuítas portugueses, após a debandada imposta pela República, que os proscreveu (foram havidos por desnaturalizados e proscritos, e se mandou que fossem expulsos de todo o país e seus domínios "para neles mais não poderem entrar"),  logo que surgiu oportunidade  retomaram a sua obra e as suas publicações. O Apóstolo, surgiu em 1915 e veio tomar o lugar do Mensageiro do Coração de Jesus. Apresentava o subtítulo de “Revista Mensal – Órgão oficial do A. O., da Consagração da Família ao Sagrado Coração de Jesus e da Cruzada Eucarística das Crianças em Portugal”.
Cada número obedecia a uma grelha temática que era bastante comum. Saía com cerca de 50 páginas e considerava-se que os diversos números de um ano eram para encadernar no fim dele, por isso a numeração das páginas não era independente por edição, antes se ia acumulando mês após mês.

Temos connosco a colecção d’O Apóstolo de 1926 e 1927, mais o número de Janeiro de 1928. Em 1929, a revista retomou o título original. 
Capa d’O Apóstolo de Abril de 1926. Repare-se que saía na Póvoa de Varzim.

Os últimos anos d’O Apóstolo e a Beata Alexandrina - 2

Transcrições d’O Apóstolo

Em Fevereiro de 1926, encontramos a primeira colaboração do P.e Mariano Pinho na revista sob o pseudónimo de Gualdim Pais; ele não residia sequer em Portugal. Coube-lhe apresentar a intenção geral do mês para a Cruzada Eucarística; o tema abordado não foi escolha sua.

Cruzada Eucarística das Crianças
C. E. C.

Intenção Geral para Fevereiro: A LUTA CONTRA A MAÇONARIA

Pequeninos associados e associadas da Cruzada Eucarística:

A Maçonaria é o maior inimigo do reino de Deus na terra. Ela é como a serpente do Paraíso. Não vos lembrais da história sucedida com Adão e Eva? Foi assim:
Um dia, a serpente (aquilo era o demónio metido nela) perguntou assim a Eva:
- Olha lá, porque é que o Senhor vos não deixa comer da fruta do Paraíso?
Esta pergunta era mentirosa e vinha cheia de malícia. Eva respondeu-lhe muito bem:
- Nós comemos de tudo o que há no Paraíso; só do fruto da árvore que está no meio é que o Senhor nos proibiu de comer, dizendo-nos que, se comêssemos dele, morreríamos.
Vede agora, meus pequeninos, a maldade da serpente no que respondeu a Eva.
- Qual morrer nem meio morrer! Vós não morrereis. Deus sabe per­feitamente que no dia em que comerdes desso fruto se vos abrirão os olhos e sereis como deuses conhecendo o bem e o mal.
Eva aqui ficou-se calada e deixou a serpente tratar assim de mentiroso ao Senhor. Ah, é que se pôs a olhar para o tal fruto proibido e viu que era lindo e apetitoso! E depois, também lhe agradou aquela ideia de ser tão sábia como Deus e não precisar do Senhor para nada.
O que aconteceu no fim de tudo isto, todos o conhecem. A sabedoria, prometida pela serpente, deu numa ignorância pasmosa, pois os homens ficaram mais estúpidos do que nunca o foram.
A delícia esperada foi terem Adão e Eva e termos nós todos de nos matar de trabalho para arranjar o pão para a boca, e ainda em cima toda essa miséria de doenças, de guerras e de males que fazem deste mundo um vale de lágrimas.
Pois, meus meninos e meninas da Cruzada, a história da Maçonaria é esta mesma história. Começou a Maçonaria no dia 24 de Junho do ano de 1717, isto é, há duzentos anos, na Inglaterra; e hoje está espalhada por todo o mundo. O que ela pretende é criar um mundo novo, uma espécie de Paraíso onde todos os homens encontrem a sabedoria e a felicidade fora da obediência a Deus e só por meio dos bens da terra, sem precisarem de Deus para nada.
Por isso os mações o primeiro que fazem é organizar-se em segredo para se apoderarem do governo das nações e em seguida tirarem a religião das escolas e dos hospitais e roubarem à vontade tudo quanto a Igreja tem de seu. Deste modo ficam as crianças sem conhecimento de Deus, os doentes morrem sem Sacramentos e, por falta de meios, a Igreja fica sem ter padres que salvem as almas!
Ao mesmo tempo, como não têm temor de Deus, os mações também não sabem o que seja amor do próximo e por isso tratam logo de se fazerem felizes a si e aos da sua seita à custa do que é bem de todos. Aos outros guerreiam-nos e perseguem-nos. – Daqui a desordem, as revoluções, a desgraça, a vida tornada um inferno, onde nem uns nem outros têm paz nem descanso.
Tal e qual como o demónio no Paraíso. O que ele quis foi satis­fazer o seu gosto de se vingar de Deus levando os homens a pecarem contra o seu Senhor. Depois homens e demónios a sofrerem juntos no inferno, sem gozarem nunca uma pontinha de felicidade.
Por isso a Santa Igreja amaldiçoa tanto a Maçonaria e excomunga os que nela se vão meter, e os Sumos Pontífices nos recomendam que desmascaremos e combatamos essa seita inimiga de Deus e das almas e da paz e felicidade do mundo.
Meus, pequeninos da C. E., orai para que N. Senhor converta estes seus inimigos e desfaça o poder maçónico.

Intenção Nacional. – Pedir o rápido estabelecimento da Reparação Nacional em todas as freguesias.

Muito mais importante para compreender a decisão da Alexandrina de se oferecer como alma-vítima é uma transcrição da revista Legionários das Missões, que o P.e Pinho tinha criado anos antes em S. Salvador da Baía. Saiu em Outubro de 1926.

Vítima voluntária

Do interessante periódico «Legionários das Missões», que se publica o Colégio António Vieira, na Baía, copiamos com a devida vénia, a edificante narração do acto heróico praticado em 1915 pelo cónego francês Valadier:

Em Junho de 1915, quando estava no auge a campanha nefasta da imprensa que queria tornar responsável da guerra o Papa perante a opinião pública da França, o cónego Valadier que estava moribundo, levado do seu amor filial para com a Santa Sé, escreveu ao Vigário de Jesus Cristo uma carta admirável, em que dizia ao terminar:
Não podendo fazer nada que seja verdadeiramente grande e digno de um tão nobre fim, posso ao menos dispor da minha vida e fazer dela o sacrifício alegre e generoso em bem de Vossa Santidade.
Nesse dia, pois, dedicado aos bem-aventurados Apóstolos Pedro e Paulo, eu, o ultimo dos Vossos Sacerdotes, há um ano doente, preso num leito de sofrimentos, impossibilitado de dizer missa e, até agora, pouco conformado com a minha sorte, dou-me a Jesus Cristo como vítima voluntaria para reparar os insultos feitos ao Chefe da Igreja, renuncio ao desejo de pedir a minha cura e aceito ver agravar-se a minha doença por todo o tempo que aprouver ao Senhor, fazendo-lhe o oferecimento da minha vida a fim de que amaine depressa a tormenta levantada pela imprensa ímpia, e que todos os corações dos católicos de França reconheçam o seu erro e aclamem o Papa da paz com o mesmo entusiasmo com que aclamaram o Papa da Eucaristia.
Tal é o meu desejo, Santíssimo Padre, tal é o pacto da minha piedade filial, concluído com o céu na presença da Sa­grada Hóstia.
A oblação foi aceite. Um telegrama do Cardial Gasparri o comunicava ao signatário da carta nos seguintes termos:
O Santíssimo Padre, profundamente comovido e conso­lado pelos sentimentos de piedade filial e pelo espirito de sacri­fício do Cónego Valadier, manda-lhe os sentimentos da sua paternal gratidão. Sua Santidade pede a Nosso Senhor a graça de ser Ele a força do querido doente, e, nesta esperança, envia-lhe de todo o coração a bênção apostólica.
Esta bênção confirmou na paz da alma o Cónego Valadier.
Daí por diante as dores podiam ir crescendo. Ele as saberia suportar com uma firmeza de ânimo digna da causa por que as padecia. Na véspera de morrer, falando ao seu confessor, pergun­tou-lhe angustiado:
- Não me dissestes, Padre, que tinha que dar um passo tre­mendo? Estarei ainda longe dele?
- Meu querido filho, explicou-lhe o confessor, esse passo terrível era o da aceitação da morte. Já há muito tempo que passou. Daqui por diante já o não esperam senão consolações. Nosso Senhor vem ter consigo a passos apressados e com os braços abertos.
O rosto do doente iluminou-se com um sorriso que lhe res­tituiu a antiga fisionomia. Respondeu: «Ah, que felicidade!»
Foram estas as últimas palavras ouvidas dos lábios do sacer­dote heróico que, inspirado do Ceu, tivera a peito oferecer osten­sivamente a vida em prova do seu amor ao Chefe da Igreja.

Há algum paralelismo com o caso da Alexandrina, que também estava doente como o cónego francês Valadier.
Em Fevereiro de 1927, na secção da Reparação Nacional, saiu outra transcrição também susceptível de impressionar a Alexandrina:

Reparação Nacional

R. N.

Um livro e o apostolado do sofrimento nas famílias

O Rev. Padre Raul Plus, da Companhia de Jesus e já muito conhecido dos leitores desta secção, teve a gentileza de oferecer ao autor destas linhas um exem­plar dum livro que sua Rev.ª reviu e anotou c pôs ao serviço das almas em nova edição. Fora escrito pelo P. Lyonnard, também da Companhia de Jesus, e tem por título: L'Apostolat de la Souffrance: O Apostolado do Sofrimento (1).
Em carta escrita ao P. Lyonnard, ao publicar-se a 4ª edição deste livro, dizia-lhe o P. Anderledy, geral dos jesuítas:
- A ideia que o título do seu livro des­perta é eminentemente prática. Toda a gente sofre: por conseguinte toda a gente pode ser apostolo. O sofrimento é o mais poderoso agente do apostolado, foi o sofrimento do Filho de Deus que salvou o mundo. Por outro lado, são tantas as dores que ficam estéreis que V. Rev.ª fez bem em recordar às almas o proveito que podem e devem tirar dos sofrimentos.
Para consolação dos nossos leitores vamos transcrever um pequeno capítulo o qual o santo P. Lyonnard intitulou: O apostolado do sofrimento nas famílias.
- Onde deve exercer-se o apostolado do sofrimento do qual as precedentes considerações nos revelaram a excelência e a misteriosa fecundidade? Qual é o campo, o teatro onde os apóstolos do sofrimento devem realizar a sua Missão?
O campo do zelo católico é o mundo inteiro, e o verdadeiro apóstolo do so­frimento não exclui das suas intenções caridosas nenhuma das almas que Jesus ­Cristo resgatou com o seu sangue. Contudo, apesar de sofrer por todos os homens em geral, ele dirige de maneira particular a acção misteriosa dos seus sofrimentos para aqueles que o Espírito Santo lhe indica; porque entra, com efeito, nos desígnios de Deus e pede-o a harmonia geral das suas obras, que, a cada operário que trabalha na vinha do Senhor, seja designada uma parte, a fim de que, concentrando principalmente as suas forças nesse ponto particular, possa agir com maior eficácia,
É isto que o Espírito Santo costuma inspirar às almas que se deixam con­duzir pela sua graça. Ao sopro vivificante deste divino Espírito, a alma cristã, o coração cristão, recebem como que um duplo impulso, um duplo movimento: um universal, que o impele a estender o seu amor e o seu zelo sobre todos os mem­bros de Jesus Cristo, sobre todos os filhos da Igreja e até mesmo, se a alma se dilatou no contacto com o Coração SS.mo de Jesus, sobre a humanidade inteira para a levar ao serviço e ao amor do seu Criador. Mas a par deste movimento universal que faz com que a alma fiel se expanda sobre o mundo, como para o fecundar com a sua oração, com os seus sofrimentos, com os santos ardores do seu amor, há um movimento mais especial, mais circunscrito e mais restrito que ordinariamente indica à alma o desígnio particular de Deus sobre ela e que parte da sua vinha lhe é dada a cultivar. Este movimento interior é o atractivo da graça, a direcção particular do espírito Santo atraindo a alma ao terreno onde ela deve de maneira especial despender as suas forças, e dirigindo-a no trabalho e na cultura desse campo misterioso.
Daí se conclui que Deus destina a cada um dos cristãos que sofrem em união com o seu divino Filho, um campo particular onde o seu sofrimento deve levar frutos de salvação para si mesmos e para os outros. Demos algumas expli­cações mostrando cada um dos apóstolos do sofrimento no posto de honra ande a divina Providência os colocou.
Comecemos pela família cristã.
Nem sempre acontece que cada um dos membros que a constituem seja um membro vivo da Igreja.
Muitas vezes, sobretudo na nossa época, Deus encontra inimigos até no seio das famílias onde não deveria encontrar senão amigos e servos fieis: mas, muitas vezes também por um contraste, pelo qual devemos bem dizer a Providência, ao lado destas almas manchadas pelo pecado, aparece a suave e serena figura do so­frimento personificada num anjo de pureza, que sofre e ora pelos membros da sua família que não querem orar nem sofrer.
Quem poderá dizer a excelência, a eficácia da missão verdadeiramente divina que cumprem no seio das suas famílias estes anjos de paz, estas vítimas inocentes, cujas orações e sacrifícios, como outros tantos pára-raios, afastam da cabeça dos seus próximos os raios da divina Justiça prestes a desabar sobre eles?
Maria, sobre a terra cumpriu esta missão de misericórdia a favor de toda a família humana da qual ela era já pela sua oração fervorosa pelas suas virtudes incomparáveis e pela sua admirável paciência, a advogada e a vítima de agra­dável odor.
Mónica, a mãe de Agostinho, geme por ver o filho da sua ternura esquecer as suas lições e consumir em prazeres pecaminosos os mais belos anos da sua juventude. Mas Mónica é Mãe e é cristã; ela sabe quanto podem junto daquele que conta até os menores suspiros dados por amor, as orações e as lágrimas duma mãe que pede ao Senhor a conversão do seu filho. E então, ora, chora e sofre para obter esta graça em favor do seu Agostinho. Ela é ouvida e todos sabem com que magnificência da parte de Deus.
Porque não somente Ele lhe concede a conversão do seu filho mas ainda o escolhe para fazer dele um vaso de eleição no qual derramará com o perfume das mais suaves virtudes, os tesouros duma ciência toda divina. Bispo, doutor, incomparável génio católico, Agostinho espalha pelas suas virtudes, pela sua doutrina e pelos seus escritos, um brilho imortal sobre a Igreja. Tal é o poder da oração e do sofrimento levado em união com Jesus Cristo pela conversão dos pecadores, sobretudo por aqueles que nos estão ligados pelos laços do sangue!
Mães cristãs, esposas cristãs, lembrai-vos sempre de Mónica, mãe de Agos­tinho; a exemplo deste modelo consumado das mães e das esposas cristãs, sede apóstolas no seio das vossas famílias, não somente pelas orações, pelos bons con­selhos, pelos bons exemplos, mas ainda pelos vossos sofrimentos, penas e des­gostos sofridos com resignação, com amor, pela conversão do vosso marido que não pratica a sua religião, que é talvez, ímpio, escandaloso; pela conversão ou pela perseverança dos vossos filhos.
Sim, sede apóstolas do sofrimento em primeiro lugar por aquelas que Deus uniu a vós duma maneira mais Íntima pelos laços do sangue; e em seguida, esten­dei numa justa proporção este apostolado a todos os vossos parentes. E que seja esse o campo de predilecção onde de preferência o exerçais.,
Cumprido este primeiro dever não esqueçais que o coração do cristão deve ser grande como o mundo e abraçar na sua vasta amplidão todos os filhos da Igreja, nossos irmãos, membros de Jesus Cristo como nós, todos os filhos da huma­nidade, nossos semelhantes, criaturas de Deus, como nós.
É por isso que, depois de ter dito a Nosso Senhor com este transporte de coração que vai direito ao Coração divino, "Ó meu Jesus, aceitai os sofrimentos, os desgostos, as privações que eu sofro pela conversão do meu marido, dos meus filhos, do meu irmão, da minha irmã, dos meus parentes, ou pela sua perseverança no bem", ajuntai: "Ó Jesus aceitai-os também pelas necessidades da Santa Igreja, minha mãe, do Sumo Pontífice, meu pai, de todos os cristãos, meus irmãos, sobretudo pelos desta paróquia, pela perseverança dos justos, pela conversão dos peca­dores, pela salvação dos moribundos em particular pelos que hoje morrerem, pelo alívio das almas do Purgatório, pela completa extirpação das associações anti­católicas que nos querem tanto mal, pela humilhação dos vossos inimigos e enfim pela conversão dos infiéis.
Assim suportado e oferecido em união com Nosso Senhor Jesus Cristo, o vosso sofrimento terá as condições necessárias para ser um sofrimento perfeitamente apostólico. Sofrendo deste modo e por estes fins secundareis o duplo impulso de que falamos e que o Espírito Santo costuma imprimir nas almas dóceis: um impulso de zelo universal que inclina a alma a orar e a sofrer por todo o corpo da Igreja e pelas necessidades espirituais de todos os seus membros e mesmo da humanidade inteira e um impulso de zelo mais circunscrito que a leva a orar e a sofrer duma maneira particular por tal pessoa ou por tal categoria de pessoas; por tal necessidade da Igreja em particular ou por uma intenção de preferência a outra.
Membros das famílias cristãs, pai, mão, filhos, irmãos e irmãs, cumpri fiel­mente uns para com os outros este duplo apostolado da oração e do sofrimento e, quando a adversidade vier visitar a vossa casa, despertai a vossa fé e agradecei ao Senhor.
Essa adversidade, essa doença, esse revés, esse infortúnio, essa separação dolorosa, é a cruz de Jesus que começa a erguer-se na vossa casa.
Esse membro da vossa família, enfermo ou aflito, se sabe unir a sua enfermi­dade ou a sua aflição aos sofrimentos do Salvador, é um membro de Jesus Cristo a sofrer na doença ou na aflição; é de algum modo o mesmo Jesus Cristo pregado à Cruz na pessoa do seu membro sofredor.
Se, por um milagre, a vossa casa se transformasse de repente num Calvário e vos fosse dado contemplar o vosso divino Redentor na cruz com os pés e as mãos trespassados pelos cravos, a cabeça coroada de espinhos e o corpo dilacerado, com que respeito, compaixão e amor contemplaríeis o vosso Salvador sofrendo morrendo por vós!
Pois bem, sabei que este espectáculo é de certa maneira posto diante dos vossos olhos todas as vezes que há na vossa família um membro de Jesus que sofre e que sofre como cristão.
Então a vossa casa é um segundo Calvário; o leito do doente, do agonizante é a cruz à qual ele está pregado e ele próprio representa Jesus sofrendo, agoni­zando, morrendo.
Vós considerais uma bênção ter um crucifixo dependurado na vossa casa no vosso quarto ou no vosso oratório: pois acreditai, um cristão doente, ou atribulado que suporta os seus sofrimentos com paciência e amor é um crucifixo vivo. A sua presença atrai sobre a vossa casa e sobre aqueles que a habitam as bênçãos do Céu ou afasta as maldições que cairiam sobre ela por causa dos pecados de alguns dos seus membros.
A bem-aventurada Ana Taigi é um exemplo significativo do apostolado do sofrimento no seio da família. Esposa e mãe cristã, cumpriu todos os seus de­veres com uma perfeição digna de ser apresentada como modelo; mas o que há talvez de mais admirável nesta mulher forte, é a sua paciência inalterável no meio dos sofrimentos e o grande amor com que os sofreu pelas necessidades da Igreja, das almas e em particular pelas necessidades espirituais e temporais dos seus, sobretudo de seu marido e dos seus filhos. Simão de Xavier


O que escrevemos não prova indiscutivelmente a dependência da decisão da Alexandrina de se oferecer como vítima face a’O Apóstolo. Mas mostra-a como muito provável.

domingo, 13 de outubro de 2013

No dia da festa da Beata Alexandrina

Hoje, dia da festa da Beata Alexandrina e de grande júbilo para todos os seus amigos, estamos a iniciar um estudo sobre O Apóstolo, uma revista que nos parece que influenciou decisões importantes dela. Colocamos abaixo cópia duma página de edição recente do Diário do Minho que lembra a miraculada da Beatificação.
Leia também estas duas notícias de hoje: Papa consagra-se a Nossa Senhora de Fátima e a Diocese de Braga tem um novo Beato.

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

A SANTA CRUZ DE BALASAR E O CONTEXTO RELIGIOSO E POLÍTICO AO TEMPO DA SUA APARIÇÃO - 1

Em 1827, o arcebispo de Braga faleceu e só voltou a haver arcebispo no princípio da década de 1840. Nestas circunstâncias, elegia-se um vigário capitular para administrar a diocese; foi assim no período mais difícil da revolução liberal.
Nos livros paroquiais "dos capítulos das visitas e pastorais" guardam-se documentos então recebidos de Braga. Os que aqui colocamos são de grande interesse para conhecer o contexto em que decorreram os primeiros anos da história da Santa Cruz.
No primeiro documento, é notório o apoio do vigário capitular Manuel Ramos de Sá a D. Miguel, que recentemente assumira plenamente o governo do país.
O segundo é contra a Maçonaria.
Capa do Livro das Visitas e Pastorais donde
copiámos os documentos que aqui vamos colocar.
 
O terceiro data já de quase um ano após a aparição da Santa Cruz. Os liberais estavam cercados dentro dos muros da cidade do Porto, o cisma já aí se instalara, mas o vigário António Alexandre da Cunha Reis da Mota Godinho considerava que a vitória sobre os inimigos de D. Miguel seria apenas uma questão de tempo.
O quarto e o quinto datam de depois da derrota de D. Miguel. A Diocese tinha então à sua frente um terrível vigário capitular intruso. E ainda era ainda vivo o legítimo…
Naturalmente estes documentos foram lidos na igreja de Balasar. Ouviram-nos por exemplo Custódio José da Costa e António José dos Santos.

Para completar o conjunto, ainda acrescentamos mais dois documentos, um do Vigário Capitular interino António Pires de Azevedo Loureiro, de 1836, e outro de António Joaquim de Aguiar, o Mata-Frades, obtido a pedido de António Pires de Azevedo Loureiro. Foi este último, intruso, cismático, que promulgou a “Carta de Sentença Cível de Património da Capela da Santa Cruz de Jesus Cristo colocada na freguesia de Santa Eulália de Balasar”.

A SANTA CRUZ DE BALASAR E O CONTEXTO RELIGIOSO E POLÍTICO AO TEMPO DA SUA APARIÇÃO - 2

Documentos da autoridade bracarense legítima

Circular de apoio a D. Miguel

D. Miguel assumira poucos meses antes plenamente o governo do país.
O Vigário Capitular apela vigorosamente a que o Clero da diocese seja generoso no auxílio monetário ao Rei, de quem faz um elogio exagerado. Associa as intenções dos liberais aos ataques à Igreja no tempo da Revolução Francesa.


Manuel Ramos de Sá, Chantre da Sé Primaz, Vigário Capitular nesta Corte e Arcebispado de Braga pelo Ilustríssimo e Reverendíssimo Cabido dela, sede vacante

Sendo bem patente a todos os Rev. Párocos e mais Eclesiásticos deste Arcebispado Primaz o actual empenho da Monarquia prodigiosamente levantada do último abatimento a que a tinham levado as violências e ataques dos mais pérfidos inimigos que no seio da pátria e no tenebroso antro das cavernas preparavam a total dissolução do vínculo sociável (sic) e da ordem pública estabelecida pelo primeiro monarca português com alta sabedoria, ligando-se com o soberano interesse da augusta Religião de Jesus Cristo e com a propriedade externa da sua Igreja; sendo a todos bem notórias as inevitáveis e importantíssimas despesas que tem feito a Real Fazenda para o salvamento da Religião e do Trono, que felizmente se acha a salvo da rigorosa tribulação e do naufrágio pelas sublimes virtudes, superior constância, alta sabedora e ânimo verdadeiramente real de um Rei em tudo o primeiro, é de rigorosa justiça que todos os bons portugueses e particularmente o corpo eclesiástico se una aos pés do Trono e coadjuve o excelso monarca não só com as lições e exemplo de lealdade, mas igualmente contribuindo para as importantíssimas despesas que se têm feito e continuam a fazer, com os generosos donativos que couberem nos limites da sua possibilidade imitando a bondade e generosidade dos seus maiores noutras épocas da monarquia que porventura não foram tão perigosas.
O Clero da Corte e de outros bispados já segue os seus passos e o Rev. Cabido desta Santa Sé Primaz, não menos zeloso e igualmente interessado, abriu exemplo no corpo eclesiástico deste Arcebispado oferecendo a quantia que o estado das suas rendas permitia.
Confio portanto das virtudes religiosas, morais e públicas de todos os Rev. Párocos e mais Clero deste Arcebispado Primaz que pronta e generosamente se prestarão a concorrer para um donativo que o interesse comum exige e a utilidade particular imperiosamente pede não só porque o corpo eclesiástico deve abrir exemplo no rebanho que lhe está confiado e interessar-se decididamente na conservação da antiga ordem pública, mas porque, se a detestável facção conseguisse levar a cabo seu plano destruidor, nem a fazenda nem a liberdade nem mesmo a vida lhe pouparia.
D. Miguel
A prova está na triste experiência dos últimos acontecimentos revolucionários; e se algum miserável eclesiástico teve a desgraça de se deixar iludir pela enganadora esperança de ocupar os benefícios mais pingues, já tenha sobejas provas para se convencer de que a facção destruidora intentava abolir e acabar com tudo aquilo que tivesse ligação com a fé e moral de Jesus Cristo e leis da sua Igreja, copiando fielmente os passos da revolução da França e porventura adiantando mais alguma coisa.
Os erros alheios servem para melhorar a nossa conduta. Se todo o Clero da França se unisse ao Trono e sacrificasse por algum tempo o seu particular interesse, talvez não perderia em pouco tempo todos os seus bens e a sua consideração até finalmente ser exterminado e barbaramente assassinado.
Por tão ponderosos motivos e outros que a todos são óbvios, espero que os Rev. Párocos e mais Eclesiásticos que ainda não tiverem contribuído para o donativo o farão segundo as suas posses por respectivos distritos, desejando muito ver escritos seus nomes nas listas que se forem publicando na gazeta ministerial.
O Rev. Desembargador Vigário Geral desta Corte, servindo de Provisor, mandará passar as ordens necessárias para que esta circular chegue à notícia de todos.
Braga, 11 de Setembro de 1828.

Manuel Ramos de Sá, Chantre e Vigário Capitular

A SANTA CRUZ DE BALASAR E O CONTEXTO RELIGIOSO E POLÍTICO AO TEMPO DA SUA APARIÇÃO - 3

Circular contra a Maçonaria

O Vigário Capitular de Braga, na altura da publicação da Carta Apostólica do Papa Leão XII contra as sociedades secretas, condena vigorosamente a Maçonaria e apela ao Clero e ao povo fiel para corrigirem as suas práticas menos condizentes com o espírito do Cristianismo.


Manuel Ramos de Sá, Chantre da Sé Primacial, Vigário Capitular, sede vacante, do Arcebispado Primaz das Espanhas

Papa Leão XII
Faço saber a todos os Rev. Párocos, clero secular e regular e mais pessoas deste Arcebispado que o Santíssimo Padre Leão XII, que felizmente preside à Santa Universal Igreja de Deus, ferido profundamente pelo horroroso aspecto com que nos últimos e calamitosos tempos se presentou o espírito da perversidade e da perfídia, espalhando insidiosamente máximas erróneas entre o povo inocente com o fim criminoso de o encaminhar à geral corrupção e incredulidade, animado pelo fervoroso zelo e pastoral solicitude com que incessantemente vigia sobre todo o fiel rebanho que lhe está confiado, desejando afincadamente conservar ileso o sagrado depósito da Fé e da Religião Revelada e pureza de costumes e obstar prontamente ao progresso de tantos males que o Inferno tem vomitado nos passados tempos pela infame organização das sociedades secretas da Maçonaria, Pedreiros Livres ou qualquer que seja a sua detestável denominação, expediu suas Letras Apostólicas “Quo graviora mala”, datadas em Roma, aos 13 de Março de 1825, pelas quais confirma e excita à observância das diferentes Bulas publicadas por vários Pontífices, seus ilustres Predecessores contra as ditas sociedades e de novo proíbe e condena as ditas sociedades ora existentes ou as que com o tempo possam formar-se debaixo de qualquer título, especificando pelos seus nomes algumas que mais claramente e sem rebuço se propõem ainda que debalde destruir a Igreja de Jesus Cristo e aniquilar o supremo poder civil.
Às quais letras apostólicas o muito alto e muito poderoso Rei e Senhor D. Miguel Primeiro, nosso legítimo e notável Senhor, que sua excelsa piedade e sincera religião, como detentor sempre fidelíssimo, foi servido acordar seu real beneplácito e régio auxílio para se publicar e executar nestes seus reinos e domínios, sendo lidas à estação da Missa e fixadas em todas as igrejas na forma do estilo e praticado em semelhantes casos.
Desejando eu dar humilíssimo testemunho do profundo respeito e religiosa veneração que todos devemos a tão sábias e luminosas determinações dos soberanos poderes espiritual e político e bem assim prova decisiva de excelente ânsia com que suspiro pela sua fiel e pronta execução, ordeno, debaixo das mais severas responsabilidades, a todos os Rev. Párocos deste Arcebispado e às mais pessoas a quem competir copiem nos respectivos livros das suas igrejas as mencionadas letras apostólicas ou neles insiram os impressos que delas obtiverem, juntamente com esta circular, e publiquem tudo uma e muitas vezes à estação da Missa Conventual com a maior clareza e distinção a fim de que todos os fiéis conheçam bem e entendam o que nelas se contém e determina.
Não posso por um só momento hesitar sobre a exactidão e delicioso júbilo com que os mesmos Rev. Párocos cumprirão tão adequadas e saudáveis providências contra a origem de todos os males que há tantos anos oprimem os fiéis portugueses e os de todo o mundo. Contudo não me dispenso de recomendar-lhes, assim como a todos os oradores evangélicos, que empenhem toda a eficácia de seu fervoroso zelo para persuadirem aos seus paroquianos e ouvintes a rigorosa obrigação que se lhes impõe de abjurar e para sempre detestar os falsos princípios, as doutrinas erróneas e imorais de qualquer sociedade reprovada na qual por desgraça sua se iniciassem, de fugir para sempre dos seus tenebrosos ajuntamentos e funestas assembleias e igualmente a obrigação de denunciar aos Prelados e às mais pessoas a quem isto pertencer a todos aqueles que souberem estão alistados nas ditas sociedades proscritas ou para esse fim aliciarem os incautos debaixo de qualquer pretexto que se lhes presente tão horrorosos atentados contra os Supremos Poderes.
Devem enfim os Rev. Párocos e mais Oradores Evangélicos mostrar aos seus ouvintes, pelo modo mais claro, como concorrem na terrível pena de excomunhão, sem outra sentença, se caírem, no abismo de não obedecer aos justos decretos e pastorais admoestações do Supremo Pastor que os adverte dos seus erros e chama ao caminho da salvação com a mais afectuosa ternura do seu paternal coração e só deixa cair o raio da morte porque os meios de suavidade e doçura não aproveitam àqueles que com o colo levantado caminham contra Deus no orgulho do seu nada; se, penetrado do vivo sentimento como os Padres de Antioquia quando pronunciaram contra Paulo de Samosata sentença de excomunhão, é que descarrega o terrível golpe; se, gemendo profundamente, como os de Éfeso quando condenaram a Nestório, é que usa de rigor; se, chorando copiosas lágrimas como os santos Leão e Flaviano, quando excomungaram a Eutiques, é que pronuncia a espantosa sentença da eterna condenação. Mas enfim esses génios pertinazes na maldade e irreligião é que querem ser tratados como predilectos da Igreja já são membros podres dela: é necessário separá-los para acautelar os vigorosos, é necessário punir os maus para conservar os bons.
O claro exemplo desses ilustres mestres do Cristianismo que não desembainharam a espada da excomunhão senão depois de muitos gemidos e no derradeiro extremo do mal são evidentíssima prova da sua gravidade. Sim, em todo o tempo um excomungado foi considerado como um gentio e um publicano, havido como infestado e excluído da comunhão dos fiéis, sendo-lhes proposto como objecto de horror e abominação, o que nas actuais circunstâncias, com muito maior razão, se lhes deve propor e persuadir.
Todos sabem quanto se esforçaram os perturbadores da paz da Igreja e tranquilidade do Estado para deprimir nos tempos proximamente passado o poder da Igreja, desacreditar a autoridade do sucessor de S. Pedro e mais sucessores dos Apóstolos; todos sabem com quanto empenho trabalham por levar ao esquecimento as penas canónicas; levantam por toda a parte contra eles altos clamores, proferindo todo o género de impropérios e desprezando os seus efeitos para não serem temidos por aqueles que ainda conservam nos seus corações algum sentimento de temor de Deus e piedade com o fim de conduzirem os povos à irreligião e rebelião contra todo o poder para só eles dominarem no excesso da sua perfídia, do seu despotismo e da sal barbaridade, tendo por seu deus a mais infame paixão da insaciável cobiça, por lei a sua orgulhosa vontade e não reconhecendo outra moral que não fosse a do voluptuoso Epicuro, em cuja escola parecem educados os sectários dessas tenebrosas sociedades.
E ainda haverá porventura pessoas de tão boa-fé e de tamanha simplicidade que possa hesitar a verdadeira existência desses pérfidos e detestáveis ajuntamentos? Ainda haverá quem se queira persuadir que este funesto contágio não tem empestado o solo português? Permitisse Deus que nos enganássemos, então teríamos passados os nossos dias à sombra da mais feliz tranquilidade, então não teríamos bebido tantas vezes o cálix da amargura. Eles com efeito se têm manifestado por muitos modos, já nos vestígios que têm deixado após si nas cavernas das diferentes cidades do reino, já nos manifestos e apologias impressas na mesma língua portuguesa, já enfim pela confissão que muitos dos seus membros têm feito de que pertencem a essas sociedades detestáveis, hediondo vómito do Inferno, ousando proferir com o maior desprezo que neles nada (há) que ofenda o Evangelho nem os preceitos da Santa Igreja, pretendendo com esta estudada malícia iludir os incautos e inocentes.
Mas os seus próprios factos os desmentem, as suas práticas os convencem de que semelhantes declarações só têm por fim seduzir astuciosamente a mocidade imberbe e pouco instruída nos dogmas da Religião Revelada e nos princípios da moral de Jesus Cristo, para abismar no deísmo, no ateísmo, no materialismo e em todo o género de absurdo que o filosofismo dos últimos séculos excogitou para riscar da memória dos homens toda a ideia da religião e todo o remorso da consciência, tribunal que no seio do mesmo ímpio levanta os seus clamores.
Dizem esses inconsequentes sectários que as suas máximas se não opõem ao Evangelho de Jesus Cristo, mas o Santo Evangelho manda obedecer à Igreja e manda observar os seus preceitos, manda respeitar o seu primeiro Pastor como sucessor de S. Pedro, os Bispos como sucessor dos Apóstolos e toda a Ordem Eclesiástica encomenda a mais profunda obediência aos Reis como imagem de Deus sobre a terra. Contudo não há calúnia contra o soberano Pastor da Igreja que se não tenha inventado, não há ultraje que se não tenha feito à Ordem Eclesiástica, não há maquinação contra o Poder Régio que se não tenha tentado por meio dessas oficinas da perfídia e da perversidade.
Isto não é uma declamação vã nem uma acusação sem provas: são ainda bem recentes esses espantosos factos praticados contra o sacerdócio e contra o império. Não é necessário revolver muitas páginas da história para o encontrarmos: ainda fumega o terrível vulcão do qual uma prodigiosa e especialíssima Providência, condoída dos nossos males, nos salvou por sua inefável bondade.
Há menos de um ano que nós presenciamos com entranhada mágoa do nosso coração os emissários dessas tenebrosas sociedades correndo por todo o solo português, espalhando os impressos mais ímpios e imorais, convidando os povos à rebelião contra Deus e contra o Rei: os lugares santos profanados, os cânticos divinamente inspirados proscritos e substabelecidos por cantigas ímpias e blasfémias. Enfim, falta só que a infame divindade do paganismo viesse tomar o lugar do Deus vivo e ocupar o trono do Santo dos Santos.
Lembrar-se-á contudo algum dos sectários dessas infames associações de responder que semelhantes factos procedem de outras causas e que atribuí-los à Maçonaria é uma falsa imputação? Miserável refúgio, pois todos esses excessos praticados em todos os tempos, em todos os lugares em que se tem manifestado essa invenção diabólica, e sempre pelo mesmo modo, não é uma prova irresistível de que são obras dos ajuntamentos que se regulam pelos mesmos princípios destruidores e que trabalham sobre o mesmo plano de irreligião, imoralidade e geral corrupção?
Se esses desgraçados filhos da perdição trabalham unidos para a ruína do Altar e do Trono e para a desgraça do povo fiel e religiosos, é preciso é preciso também que o Clero, como sentinela vigilante da Casa do Senhor, unindo a si o povo inocente e conformando-se com as sábias determinações do Supremo Pastor, com as piedosas intenções do Augusto e Fidelíssimo Monarca que preside ao feliz destino dos venturosos portugueses, com  a religião e piedade da invicta Imperatriz, vítima da mais rigorosa perseguição, modelo de constância, concorra quanto cabe nos limites da sua possibilidade para destruir e suplantar a venenosa hidra que há tanto tempo empenha todas as suas forças na ruína dos objectos mais sagrados e mais caros a todos os fiéis portugueses.
E para que o Clero possa conseguir tão louvável fim, é necessário que se reforme tanto no interior como no exterior: no interior, pelo exercício da oração, pela contínua lição dos livros sagrados, dos tratados de moral e disciplina eclesiástica e finalmente pela contínua prática das virtudes que demanda a sua lata dignidade; no exterior, pelo decoro e gravidade do seu comportamento pela decência dos seus vestidos, tão recomendada nos sagrados cânones, conformando-se com eles em todos os cerimónias (?), em todos os lugares e em todas as ocasiões, muito principalmente no exercício das funções do seu sagrado ministério.
Para que por uma vez cesse o escandaloso abuso que nesta parte da disciplina eclesiástica se introduziu, que poda de alguma sorte desculpar-se nos últimos calamitosos tempos, mas que já hoje felizmente se não pode tolerar, ordeno que todo o eclesiástico de qualquer ordem que seja, nas funções sagradas, use dos hábitos talares na forma determinada na Pastoral que a semelhante respeito expediu o Excelentíssimo Sr. D. Miguel da Madre de Deus, último prelado deste Arcebispado, e com as penas nela declaradas e pela forma estabelecida, ficando além disso os transgressores sujeitos aos procedimentos da justiça havendo denúncia. Em todas as mais ocasiões, encomendo e rogo a todo o Clero que, para honra e decoro do mesmo, observe a maior honestidade na cor e forma dos vestidos, conforme está determinado na Constituição Diocesana, tít. 12, const 1.ª, debaixo das penas ali declaradas. Outrossim proíbo a todo o eclesiástico o uso de pantalonas largas por cima de botinas, como género de vestido impróprio da ordem eclesiástica e muito repreensível pelo escândalo que causa a toda a classe de pessoas que sabem ponderar a gravidade e modéstia que deve resplandecer nos sujeitos dedicados ao ministério do Altar, desejando nesta parte fazer observar as antigas leis disciplinares já citadas com inovação das quais depende grande parte do bom regulamento do Clero secular deste Arcebispado.
O povo fiel deve unir-se aos seus pastores e ouvir a sua voz. Para isso é indispensável que nos domingos e dias santos de guarda concorra às próprias e respectivas paróquias para celebrar com o seu próprio pastor os sagrados ministérios da nossa santa Religião, para se instruir no catecismo e nas práticas de piedade introduzidas com o uso e autorizadas pela Igreja, para ouvir da boca do seu próprio pároco as palavras da salvação e da vida eterna. Não é uma simples prática de devoção, é uma lei muito respeitável pela sua antiguidade, a qual se acha estabelecida na Igreja desde o princípio do Cristianismo e autorizada pelo testemunho dos ilustres pastores de todos os séculos, os quais já congregados nos santos concílios, já nos estatutos particulares das suas igrejas promoveram sempre a sua observância e usando de todos os arbítrios que a sua prudência e os eu zelo sugeriam, mas que hoje parece estar sepultada em profundo esquecimento com grave prejuízo das almas e manifesto detrimento do estado político, porque do seu esquecimento se tem seguido uma boa parte da funesta ignorância em matéria de Religião e à sombra desta lamentável ignorância se têm propagado os erros e absurdos que há tantos anos perturbam a paz de uma e outra sociedade.
Para atalhar a um tão grande mal, devem os Rev. Párocos ensinar com o maior cuidado e assídua aplicação, em todos os domingos e dias de guarda, o catecismo aos meninos, para que estas tenras plantas cresçam igualmente no temor do Senhor e desde os primeiros dias da sua vida sejam conduzidos pelos caminhos rectos da santidade e da justiça, observando a respeito dos pais negligentes em mandá-los ao catecismo o que se acha disposto na constituição diocesana e bem assim a respeito dos adultos e p ais de família que sem urgente necessidade faltam à estação da missa conventual das suas paróquias por costume, devendo entender-se que as Missas que se celebram pelas capelas filiais são tão só para as pessoa s que não podem concorrer à igreja matriz ou para aquelas que são necessárias para a guarda das casas ou se acham ocupadas noutras obrigações que se não podem, deferir para outras ocasiões oportunas devendo assim mesmo quando for possível alternar-se.
E para que estas mesmas pessoas não fiquem privadas de instrução necessária nenhum sacerdote poderá celebrar sem que antes da Missa, ao Evangelho ou noutra parte do Santo Sacrifício ensine a doutrina cristã por espaço de mais de um quarto de hora por um catecismo aprovado, o que se deve praticar sempre que haja concurso de povos, passando de doze pessoas, ficando suspensos ipso facto os refractários, sejam párocos ou simples sacerdotes.
É muito louvável a devotíssima prática usada em algumas igrejas deste Arcebispado de se rezar ou cantar o rosário, terço ou coroa de Nossa Senhora; por isso não posso deixar de recomendar a todos os Rev. Párocos desta Diocese, fazendo abrir nas tardes de domingos e dias santos de guarda as suas igrejas, convidando os povos para uma devoção que se tem mostrado ser muito do agrado de Deus por se entoarem louvores de Sua Santíssima Mãe. Por meio deles tem a Igreja triunfado dos seus maiores inimigos e os portugueses conseguiram grandes vitórias enquanto, cheios de devoção, se muniam com este sagrado escudo para o combate.
Espero portanto do fervoroso zelo que anima o corpo do Clero e da sólida piedade do povo fiel desta vastíssima Diocese que pelos motivos do interesse, que é o maior e único negócio que temos a tratar sobre a face da terra, cumpram e observem de boa vontade o que se lhes determina e diz respeito a cada um conforme a sua classe.
E para que as sobreditas Letras Apostólicas se publiquem e registem juntamente com esta Circular e tenham o seu devido efeito, o Doutor Desembargador Vigário Geral desta Corte, servindo de Provisor, mandará expedir com a brevidade que costuma as ordens do estilo.
Dada em Braga, 28 de Fevereiro de 1829.

Manuel Ramos de Sá