terça-feira, 19 de abril de 2011

A Santa Missão de Balasar, de 1950 - 4

B.   Nos Sentimentos da Alma

10 de Novembro de 1950 (sexta-feira)

Mais um colóquio do pequeno conjunto contemporâneo da santa missão.
A propósito dela, o P.e Humberto escreve que a Alexandrina promoveu duas: uma é certamente esta, a outra será a do ano seguinte, pela mesma altura.
Fixem-se as referências da Alexandrina à festa em honra do "dogma da querida Mãezinha", a de Jesus a Balasar, a bela visão da barquinha no mar encapelado e, no final, a avaliação que Jesus faz da santa missão.
Por nos aparecer que não há grande proveito em colocar em linha o quarto colóquio relativo a esta missão, este será o último.
Ao menos a partir desta data, a presença dos Missionários do Espírito Santo em Balasar torna-se muito frequente.

Só hoje, dia 16, posso cumprir o meu dever de santa obediência, dizendo o que se passou na minha alma. Não pude antes, não me deixam.
Ai, meu Jesus, quanto é doloroso o meu Calvário! Na minha cruz só a Vós eu vejo. Oh, sim, posso dizer com toda a verdade: é o amor de Jesus que me leva a obedecer, embora à minha natureza repugne este acto de obediência e aceitação à cruz. Vence a força de Jesus. Eu não tenho força para sofrer nem coragem para obedecer.
Morreu a minha coragem, a minha vontade e todas as coisas que de mim dependem. A minha alma sofre indizíveis sofrimentos. Não os sabe dizer a minha ignorância. Causa-me pavor falar dos meus sentimentos, falar da minha dor e receber as visitas que de mim se aproximam. Sinto a necessidade de me refugiar, de deixar o mundo para me esconder só em Jesus.
Estou presa ao lodo, a toda a imundície humana; não tenho asas, assim nunca poderei voar.
Ai, o Céu, o Céu, que saudades! E para maior martírio não posso pedi-lo a Jesus. Prometi-Lhe isto, não posso faltar.
Nos dias da santa missão, sacrifiquei-me muito, recebi muitos espinhos, muito sofri por Jesus e em favor das nossas almas.
Tudo morreu sem que eu lhe sentisse um pequenino sopro de vida.
Na festa em honra do dogma da querida Mãezinha, quis do meu leito associar-me a Ela. Ouvi as aclamações que na igreja se faziam. Em união com os assistentes também eu Lhe dei os meus vivas e queria acenar-Lhe com o meu lencinho branco. Não pude: rompi em lágrimas. Pedi ao Céu, pedi às avezinhas da terra e a todos os seres que A glorificassem, A bendissessem por mim. Senti como se a Mãezinha nada recebesse de mim.
Na quinta-feira, durante o dia, senti dentro em meu peito o mundo inteiro, feito num Calvário: tinha todos os instrumentos que feriam Jesus. Nada havia na terra que não fosse Calvário. A sua dureza era maior que rochedos.
O peito e o coração abriram-se em dor. Fiquei no Horto: foi esta a dor que lá me trespassou.
Senti o abandono dos Apóstolos, suei sangue ao ser esmagada pela justiça divina.
Ofereci ao Pai o cálix da minha amargura, que transbordava sangue.
Na sexta de manhã, andei pelos tribunais, em ao mesmo, tempo revoltada contra o Senhor, não quis unir-me a Ele, não quis aproveitar-me do seu Sangue divino que corri montanha abaixo. Amaldiçoando (sem ser eu que amaldiçoava) a Jesus, fugi dele, nunca o busquei, sempre O maldisse. Fiz tudo ao mesmo tempo: fui Cristo, sofri com Ele, fui mundo revoltado, cheio de vícios e crimes.
Meu Deus, meu Deus! Fiquei no Calvário, fiquei pregada na cruz e sofrer com Jesus os seus tormentos, a bradar com Ele ao Eterno Pai.
Não há língua humana que possa descrever a agonia e dor de Jesus.
Eu esperei, deixei o mundo bem pouco tempo.
Jesus veio com a sua vida dolorosa, trouxe com Ele o Céu – ou Ele era mesmo o Céu.
Senti como que a abóbada do firmamento me absorvesse. E dentro deste Céu, mas com o coração a sangrar, ouvi que Jesus me dizia:
- Minha filha, vem para o teu Céu que a ti desceu, vem para o meu divino Coração; repousa aqui, vem fortalecer-te da vida divina, vem tomar conforto para mais e mais imolação.
- Ai, meu Jesus, é certo que me sinto no Céu, na vossa paz inefável. Mas, ó Jesus, que dor a minha! O coração parece rebentar-me. Valei-me se quereis que eu resista. Dai a vossa força para que eu possa continuar a ser a vossa vítima.
- Nada temas, minha filha, nada podes temer, porque Eu estou contigo e em ti opero o milagre da graça, da perseverança.
Hás-de vencer, hás-de perseverar até ao fim. A tua dor é como já te repeti muitas vezes, é a dor que sem a tua reparação sentia o meu divino Coração.
São os crimes do mundo que assim te fazem sofrer. São os crimes dos pecadores desta freguesia privilegiada, desta freguesia selada com o selo do mais forte amor que exige teu martírio.
O inferno está em guerra, em guerra aberta contra ti ao ver as almas que lhe fogem.
Que tempestade! Que mar imenso!
Neste momento via como que toda a terra transformada em mar. Uma parte em ondas agitadíssimas, que tentavam submergir tudo. Andava entre essas ondas uma barquinha. Eu via-a e eu mesma estava nela. Era eu sozinha que remava e andava louca a apanhar as almas sem número, perdidas naquele mar tempestuoso, agitadíssimo; e transportava-as para a outra parte do mar bonançoso, de serenidade e paz.
Oh, como era lindo ver aquele mar coberto de almas parecidas com os Anjos, livres de todo o perigo, sem se mergulharem nas águas! Nadavam por si naquele mar de gozo, sem se esforçarem para nadar: estavam salvas.
Todas pareciam ter asas, asas puras, asas brancas como os Anjos. Era lindo, lindo, lido!...
Meu Deus, não sei dizer mais. Trabalhei sem cessar, vi tudo, mas sem deixar de sofrer.
- Minha filha, minha filha, é bela esta visão, mas só no Céu a podes compreender. É a tua missão: transportar almas do mar tempestuoso do vício e das paixões para o mar celeste, para o porto de salvação. Tem coragem!
Vem agora receber a gota do meu divino Sangue. Deixa unir o meu amantíssimo Coração ao teu para que ele passe. É o Sangue de Cristo crucificado a correr nas veias da sua crucificada, da continuadora da sua obra de salvação.
Jesus uniu os nossos corações; passou do dele para o meu, por entre raios de fogo, a gotinha do preciosíssimo Sangue de Jesus.
Foi neste momento que a dor me desapareceu. Sem a dor e confortada pelo amor de Jesus, fiquei mais forte; não podia separar-me dele. Jesus disse-me:
- Vai, minha filha, para a tua cruz.
Respondi-lhe:
- Estou presa, Jesus, não posso separar-me.
- Vai, vai confiante. É para que saibas que sou Eu, o divino Artista, que trabalho em tua alma com sabedoria prodigiosa e omnipotente.
Confia: o Céu ama-te. Confia: todo o Céu está contente pelo fruto desta missão, pelas almas que com o teu sofrimento conduziste ao Coração de Deus. Todo o inferno está raivoso contra ti.
Nada temas, vai para a tua cruz.
- Obrigada, obrigada, meu Jesus.

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