A última fase
Acabadas
as fontes directas, as Cartas ao P.e Pinho e o Diário, atenhamo-nos às outras
fontes: C G (Cristo Gesù in Alexandrina),
NoC (No Calvário de Balasar).
Sobre
os sofrimentos, temos duas cartas do Dr. Azevedo ao P.e Pinho. Uma é de 10 de
Janeiro de 55:
A Alexandrina está prostrada como nunca. Está a chegar
ao cimo do seu calvário... Parece que tudo tem evolucionado nesse sentido.
(NoC, p. 299 port.)
A outra, de 17 de Outubro de
55, quatro dias depois da morte.
As dores eram nos últimos meses horríveis.
Ultimamente estava a sofrer imenso, e parece-me que a
sua doença, as suas dores eram de origem sobrenatural, daquela origem a que se
refere Henri Bon, quando fala das enfermidades sobrenaturais. (NoC, pp.
298-299, port.)
E
uma carta, ao P.e Humberto, da médica Dra. Irene de Azevedo, filha do Dr.
Azevedo (querida amiga que muitas vezes tinha escrito, em substituição da
Deolinda, o que a Alexandrina ditava para os seus diários); eis algumas linhas:
Tinha-se
a sensação de que naquele quarto de dor acontecia algo de tremendamente grande
e misterioso: tinham chegado os últimos momentos duma vítima à qual tinha sido
pedida uma grande reparação.
Junto
dela, tentava dar-lhe um pouco de consolo molhando-lhe os lábios secos.
Não
ousava quase falar com o temor de lhe aumentar o sofrimento.
(...)
Pedia com insistência a Deus que a levasse depressa para o Céu: única oração
digna dela. (...) Que expressão tinha! Santa resignação à vontade de Deus, mas
sofrimento de aterrorizar, e tal que uma alma pode suportar naquele modo só com
uma graça e uma ajuda grande do Senhor.
Desde
então faço uma ideia do que terá sido a Paixão e Morte do Senhor. (...)
Contemplando o seu vulto dolorosíssimo, parecia-me ouvir a frase de Jesus:
“Pai, porque me abandonaste?”
Tudo
estava consumado. (C G, p. 694)
Em
Setembro, a mártir Alexandrina teve a generosidade de permitir à Deolinda
participar durante três dias num retiro espiritual em Fátima. Foi um esforço
heróico, porque só a Deolinda sabia acudir-lhe do modo melhor nestes últimos
tempos de dores atrozes.
A
Alexandrina, que se sentia já próxima do fim, queria dar à Deolinda, com tal
infusão de espiritualidade, a força para suportar o grande golpe. (C G p. 691)
No
princípio do “seu” mês, ouve o anúncio da partida.
Hoje, 2 de Outubro,
dia dos Santos Anjos, senti que me tocaram num ombro e ouvi cantar os Anjos.
Perguntei:
— Quem cantará com os
Anjos?
Nosso Senhor
respondeu:
— Tu, tu, tu, em breve,
em breve, em breve. (NoC, p. 299, port.)
Em
1965 Deolinda contou ao P.e Humberto o que se segue:
Aconteceu,
se não erro, em 7 de Outubro de 1955. Havendo trabalhos em casa, eu tive de vigiar
os pedreiros. A minha irmã chamou-me para me dizer:
- Deolinda,
tu foges-me!
Respondi-lhe:
- Vou e volto já!
Sentei-me
junto dela, que já se ouvia com dificuldade, e entregou-me o dinheiro destinado
às missões e o saquinho do dinheiro para a casa.
Como
é natural, fiquei impressionadíssima, porque a Alexandrina tinha administrado
sempre os nossos pobres haveres, como também o dinheiro para as obras de
caridade. (C G, p. 691, nota 17)
O dia 12
Às
duas da noite a Alexandrina diz à Deolinda que a assiste:
Vou
contar-te uma coisa que nunca te disse nunca para não te afligires.
Foi
o seguinte: no dia um de Fevereiro, logo de manhã, ouvi uma voz:
-
Faz um acto de resignação à vinda do teu Paizinho. (…)
Não
to ditei para não to fazer saber. (C G, p. 691)
Depois
acrescentou:
Logo
que seja dia, farás três telefonemas.
1.
- À menina Irene Gomes, para lhe pedir que acompanhe a casa a mãe com toda a
sua roupa; que volte definitivamente, porque eu vou morrer (a mãe estava no mar a fazer uma cura).
2.
- Ao P.e Alberto Gomes (o confessor),
por um dever de gratidão da minha parte e, se mo consentir, para repetir
publicamente o acto de renúncia à vinda do P.e Pinho.
Entretanto
avisarás o tio Joaquim que vá a chamar o Dr. Azevedo.
3.
- À Sra. Ana Pimenta (amiga e benfeitora, que tinha manifestado o desejo de
assistir à morte da Alexandrina).
Durante a manhã disse várias
vezes:
- Eu
queria o Céu.
Não
tenho peninha nenhuma de deixar a Terra.
Acabaram
todas as trevas da alma (...)
É
sol. É vida. É tudo. É Deus!
A
Deolinda a um certo ponto perguntou-lhe:
-
Queres alguma coisa?
-
O Céu, porque na terra não se pode estar.
Eu
queria receber o Sacramento dos Enfermos, enquanto estou lúcida.
Numa
iluminação sobre o futuro, exclama:
- Um
dia, vai ser muito bonito aqui!
Ó
Jesus, seja feita a vossa vontade, não a minha!
Pelas
15 do mesmo dia, na presença do confessor, do Dr. Azevedo, dos familiares e de
alguns entre os mais íntimos, fez o acto de aceitação da morte.
Registemos
o relato feito pelo sacerdote que a assistiu no momento da morte, Mons. Mendes
do Carmo.
Quando
naquelo quarto-calvário esteve tudo preparado, fez espontaneamente o seu Acto
de Resignação diante de todos.
Ó
Jesus Amor, ó divino Esposo da alma minha, eu, que na vida sempre procurei
dar-Vos a maior glória, quero, na hora da minha morte, fazer-Vos um acto de resignação
à vinda do meu Paizinho Espiritual; e assim, meu amado Jesus, se com este Acto
dou maior glória à Santíssima Trindade, submeto-me jubilosamente aos vossos
eternos desígnios... só para implorar da Vossa misericórdia o Vosso Reino de
amor, a conversão dos pecadores, a salvação dos moribundos e a libertação das
almas do Purgatório.
Meu
Deus, como Vos consagrei sempre a minha vida, Vos ofereço agora o fim dela,
aceitando resignada a morte acompanhada das as circunstâncias que Vos derem
maior glória.
Depois,
com voz clara, pediu perdão, agradeceu e perdoou a todos...
Recebeu
depois, de modo angélico, o Sacramento que purifica de todos os vestígios de culpas
e imperfeições.
O
quarto encheu-se de soluços e a Alexandrina, moribunda, disse:
- Não
choreis, porque vou para o Céu.
E
repetiu:
- Não
choreis, porque eu vou para o Céu! (C G, p.824)
Eis
algumas frases que disse a intervalos:
- Ai
Jesus, não posso ficar mais na terra.
Ai
Jesus, a vida custa; o Céu custa!
Sofri
tudo nesta vida pelas almas. Espremi-me nesta cama até a dar o meu sangue pelas
almas.
Perdoo
a todos... Foram tormentos para o meu bem.
Ai
Jesus, perdoai ao mundo inteiro!...
Agradeço
àqueles que me fizeram bem; rezarei por eles no Céu.
Estou
tão contente por ir para o Céu! (sorrindo
e olhando para o alto).
Ao
médico que à tarde a saudava antes de a deixar, disse:
Que
claridade, que luz! É tudo luz (sorrindo).
As
trevas desapareceram. (C G, pp. 692-693)
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