segunda-feira, 8 de outubro de 2012

O MARTÍRIO DOS ÚLTIMOS DEZ ANOS (1)


Como preparação para a festa da nossa Beata, vamos começar hoje a transcrever o penúltimo capítulo de Só por Amor! da Prof.ª Eugénia Signorile. Será sem dúvida um óptimo motivo para meditação. Fixemos-nos desta vez no crescendo dos seus sofrimentos físicos.

Se contemplamos a panorâmica do último decénio, vemos que o martírio da vítima vai em contínuo aumento, com sofrimentos de todo o género.
Durante um êxtase da Paixão (íntima), ao descrever o momento da subida ao Calvário, a Alexandrina dita:
Quanto mais se aproxima o fim da montanha, tanto mais difícil se torna a subida: mais agonia, mais sangue, mais abandono, mais dor. S (12-1-51)

Tal constatação adapta-se muito bem ao caminho da sua vida nesta fase. Os sofrimentos invadem toda a pessoa, quer na esfera física quer na espiritual.
Dirigiremos o olhar para uma e depois para a outra separadamente, mesmo que sejam substancialmente inseparáveis, porque uma influencia a outra.


Sofrimentos físicos

Para o fim de 1944 começa a sentir que os olhos sofrem com a luz. O P.e Humberto oferece-lhe cortinas escuras para a janela.
Em 1945 repetidas vezes alude a este tormento.
Passo os meus dias em escura prisão: os olhos do corpo não podem ver a luz e a minha alma não tem luz. S (23-7-45)

Minha filha, esposa minha, escuta: vou prevenir-te. O teu sofrimento aumentará: os olhos do teu corpo ficarão sempre como se não existisse a luz.
As trevas e a dor da tua alma serão indizíveis. S (31-8-45)

Cresce a minha cegueira, aumentam as minhas trevas. Não vejo. Escureceu-se o mundo: parece que Deus não criou a luz (...) S (6-9-45)

Chegada a Janeiro de 55, a angústia do quarto e a cegueira quase completa dão-lhe a impressão de estar numa masmorra na qual lhe falta a respiração:
(...) à pobre natureza tudo repugna: até agora o não pode ver a luz e ter de fazer do meu quarto uma masmorra escura.
Parece que quase me leva ao desespero ao precisar do ar e não poder ver a luz.
É tal a aflição que me parece que todo o meu se estrancinha. S (14-1-55)

Pela manhã de Páscoa de 55 terá um ligeiro alívio no tormento da cegueira (o Dr. Azevedo tinha-lhe dito para o pedir a Jesus). Mas será temporário. No êxtase de Sexta-feira Santa, 8 de Abril, Jesus diz-lhe:
- Minha filha, na manhã de domingo de Páscoa vais ver não a luz completa, mas sim uma meia-luz. Eu serei a força dos teus olhos.
Eu não vou aliviar os teus sofrimentos; não, minha filha, não! Ficarás assim até à tua morte. Ao perguntarem-te se estás melhor, responde com um sorriso.
Jesus alivia um lado para sobrecarregar no outro. Tu não tens aleluia nem no corpo nem na alma. Deixa-a (a aleluia) para Mim, para sustentar o braço da justiça de meu Pai e salvar as almas. (...) Esta luz não será duradoura: terás alguma hora por dia, algumas horas, alguns dias. S (8-4-55)


A Alexandrina tem também frequentemente fortes hemorragias ou outros períodos com perdas diárias. Vimos no Diário de 9 de Novembro de 45 a nota do Dr. Azevedo a propósito.
No dia antes a Alexandrina tinha ditado:
Disse muitas vezes a Jesus: Quero dar-Vos até à última gota do meu sangue pelo vosso divino amor e para acudir aos pecadores, assim como Vós o destes por mim.
Ma não pensava que Jesus tomava as coisas tanto a sério!
Só ontem é que me lembrei da minha oferta a Jesus e, como me sinto sem sangue, sem vida, temo, de um momento para o outro, deixar o mundo sem a realização das promessas de Jesus (de que lhe devolveriam o P.e Pinho como director). S (8-11-45)

Duas semanas depois dita uma expressiva comparação:
Sinto o meu corpo a dar os últimos arrancos de vida. É como uma máquina que não tem forças para arrastar o peso das carruagens. S (21-11-45)

Sempre no mesmo Novembro, diz-lhe Jesus:
As tuas falas aumentam de grandes sacrifícios, mas não nada temas, que a tua vida de amor, a tua vida de bem para as almas continua nos teus olhares, sorrisos e doçura até ao último instante.
Que vida de encantos e maravilhas divinas! S (23-11-45)

Com o passar dos anos, naturalmente, este sacrifício faz-se sempre mais gravoso:
Cada esforço que faço para pronunciar uma palavra, todo o meu ser parece desfazer-se, tal é o sofrimento que em mim sinto.
Ó Jesus, tudo por vosso amor e para a salvação das almas! Que todo o meu viver seja: sofrer e amar-Vos, amar-Vos e sofrer!
Sem a dor jamais poderia viver. S (24-10-52)

Ditar o diário torna-se sempre mais penoso! No de 15 de Outubro de 54 lê-se:
Só o Céu vê, só ele pode avaliar o meu sacrifício. Não posso falar: a cada palavra que dou parece que uma golfada de sangue me aflui aos lábios.
É só por amor a Jesus e às almas é que eu faço tão grande sacrifício.
Obedecer (P.e Humberto tinha-lhe mandado continuar a ditar o diário e enviar-lho para a Itália) quando se pode, não custa, mas quando é feito desta forma, num sofrimento indizível, é inaudito sacrifício!
Os males do corpo são tanto graves e os da alma a debaterem-se com eles.
Ó Céu, ó Céu, ó vida sem vida! S (15-10-54).

O seu heroísmo no sacrifício levá-la-á a prosseguir ainda por quase 11 meses: o último diário traz a dada de 2 Setembro de 55!
Para o fim de 46 as articulações dos braços e das vértebras desligam-se!
O Dr. Azevedo decide intervir: prepara dois apoios em forma de S alongado, que prende aos lados da cabeceira da cama; enfaixa estreitamente os braços da Alexandrina e liga-os sobre os apoios de modo que a segurem passando sob os sovacos. Além disso faz colocar duras tábuas sob o colchão e enfaixa-a em todo o corpo.
Alexandrina ficará assim até à morte, por bem 9 anos!
Isso passa-se exactamente em 3 de Outubro, aniversário da primeira crucifixão.
(Este dia aniversário,) sem reflectir e nada combinar, ficou também a ser a data em que o meu pobre corpo, ligado, ficou sobre umas duras tábuas.
Mas, apesar disso, fiquei sedenta de mais e mais dor, mais e mais amor. S (4-10-46)

Esta cama torna-se-lhe um leito de espinhos.
Quero ser vítima de Jesus e, porque o quero ser, é com o sorriso da alma que de boa vontade continuo a sê-lo na minha cama de espinhos. Como estu enredada neles! Como estou impedida do mais pequeno movimento! Quanto me ferem! S (10-7-49)

Acrescenta-se frequentemente ainda a febre, que lhe dá a sensação de ter a carne destruída.
O pobre do meu corpo continua a ser, ora numas horas ora nas outras, um esqueleto: caveira, chagas, espinhos, setas, dor e sangue.
O que é a minha dor, só Jesus o compreende. E isso me basta. S (12-9-47)

O martírio é sempre o mesmo, só com o aumento dos ardores da febre e dores triturantes, dores quase insuportáveis. Que aflição!
Só Jesus a vê e sabe compreender. S (4-11-49)

O meu corpo frito, por dentro e por fora, parece por vezes arder num verdadeiro inferno. Peço alívio, peço a mudança de posição para poder resistir sem desespero.
Noutras partes do corpo o gelo gela-me: fogo e gelo ao mesmo tempo; frio, gelo que dói, que atormenta como fogo. S (12-3-54)

Não falta sequer a insónia, naturalmente!
Passei uma noite de vigília. Sofri muito; não podia rezar. Só de longe a longe uma jaculatória podia dizer. Mas estive sempre unida a Jesus e sempre era a sua vítima. S (7-11-53)

Nas minhas noites de vigília oro, oro, uno-me aos meus Amores, ofereço-Lhes as minhas lágrimas, mas nada vale: é vão todo o meu esforço! S (18-3-55)

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