Como preparação para a festa da nossa Beata, vamos começar hoje a transcrever o penúltimo capítulo de Só por Amor! da Prof.ª Eugénia Signorile. Será sem dúvida um óptimo motivo para meditação. Fixemos-nos desta vez no crescendo dos seus sofrimentos físicos.
Se contemplamos a panorâmica
do último decénio, vemos que o martírio da vítima vai em contínuo aumento, com
sofrimentos de todo o género.
Durante um êxtase da Paixão
(íntima), ao descrever o momento da subida ao Calvário, a Alexandrina dita:
Quanto
mais se aproxima o fim da montanha, tanto mais difícil se torna a subida: mais
agonia, mais sangue, mais abandono, mais dor. S (12-1-51)
Tal constatação adapta-se
muito bem ao caminho da sua vida nesta fase. Os sofrimentos invadem toda a
pessoa, quer na esfera física quer na espiritual.
Dirigiremos o olhar para uma
e depois para a outra separadamente, mesmo que sejam substancialmente
inseparáveis, porque uma influencia a outra.
Sofrimentos físicos
Para o fim de 1944 começa a
sentir que os olhos sofrem com a luz.
O P.e Humberto oferece-lhe cortinas escuras para a janela.
Em 1945 repetidas vezes alude
a este tormento.
Passo
os meus dias em escura prisão: os olhos do corpo não podem ver a luz e a minha
alma não tem luz. S (23-7-45)
Minha
filha, esposa minha, escuta: vou prevenir-te. O teu sofrimento aumentará: os
olhos do teu corpo ficarão sempre como se não existisse a luz.
As
trevas e a dor da tua alma serão indizíveis. S (31-8-45)
Cresce
a minha cegueira, aumentam as minhas trevas. Não vejo. Escureceu-se o mundo:
parece que Deus não criou a luz (...) S (6-9-45)
Chegada a Janeiro de 55, a angústia
do quarto e a cegueira quase completa dão-lhe a impressão de estar numa
masmorra na qual lhe falta a respiração:
(...)
à pobre natureza tudo repugna: até agora o não pode ver a luz e ter de fazer do
meu quarto uma masmorra escura.
Parece
que quase me leva ao desespero ao precisar do ar e não poder ver a luz.
É
tal a aflição que me parece que todo o meu se estrancinha. S (14-1-55)
Pela manhã de Páscoa de 55
terá um ligeiro alívio no tormento da cegueira (o Dr. Azevedo tinha-lhe dito
para o pedir a Jesus). Mas será temporário. No êxtase de Sexta-feira Santa, 8
de Abril, Jesus diz-lhe:
-
Minha filha, na manhã de domingo de Páscoa vais ver não a luz completa, mas sim
uma meia-luz. Eu serei a força dos teus olhos.
Eu
não vou aliviar os teus sofrimentos; não, minha filha, não! Ficarás assim até à
tua morte. Ao perguntarem-te se estás melhor, responde com um sorriso.
Jesus
alivia um lado para sobrecarregar no outro. Tu não tens aleluia nem no corpo
nem na alma. Deixa-a (a aleluia) para
Mim, para sustentar o braço da justiça de meu Pai e salvar as almas. (...) Esta
luz não será duradoura: terás alguma hora por dia, algumas horas, alguns dias. S
(8-4-55)
A Alexandrina tem também
frequentemente fortes hemorragias ou
outros períodos com perdas diárias. Vimos no Diário de 9 de Novembro de 45 a
nota do Dr. Azevedo a propósito.
No dia antes a Alexandrina
tinha ditado:
Disse
muitas vezes a Jesus: Quero dar-Vos até à última gota do meu sangue pelo vosso
divino amor e para acudir aos pecadores, assim como Vós o destes por mim.
Ma
não pensava que Jesus tomava as coisas tanto a sério!
Só
ontem é que me lembrei da minha oferta a Jesus e, como me sinto sem sangue, sem
vida, temo, de um momento para o outro, deixar o mundo sem a realização das
promessas de Jesus (de que lhe
devolveriam o P.e Pinho como director). S (8-11-45)
Duas semanas depois dita uma
expressiva comparação:
Sinto
o meu corpo a dar os últimos arrancos de vida. É como uma máquina que não tem
forças para arrastar o peso das carruagens. S (21-11-45)
Sempre no mesmo Novembro,
diz-lhe Jesus:
As tuas falas aumentam de grandes
sacrifícios, mas não nada temas, que
a tua vida de amor, a tua vida de bem para as almas continua nos teus olhares,
sorrisos e doçura até ao último instante.
Que
vida de encantos e maravilhas divinas! S (23-11-45)
Com o passar dos anos,
naturalmente, este sacrifício faz-se sempre mais gravoso:
Cada
esforço que faço para pronunciar uma palavra, todo o meu ser parece
desfazer-se, tal é o sofrimento que em mim sinto.
Ó
Jesus, tudo por vosso amor e para a salvação das almas! Que todo o meu viver
seja: sofrer e amar-Vos, amar-Vos e sofrer!
Sem
a dor jamais poderia viver. S (24-10-52)
Ditar o diário torna-se
sempre mais penoso! No de 15 de Outubro de 54 lê-se:
Só
o Céu vê, só ele pode avaliar o meu sacrifício. Não posso falar: a cada palavra
que dou parece que uma golfada de sangue me aflui aos lábios.
É
só por amor a Jesus e às almas é que eu faço tão grande sacrifício.
Obedecer
(P.e Humberto tinha-lhe mandado continuar
a ditar o diário e enviar-lho para a Itália) quando se pode, não custa, mas
quando é feito desta forma, num sofrimento indizível, é inaudito sacrifício!
Os
males do corpo são tanto graves e os da alma a debaterem-se com eles.
Ó
Céu, ó Céu, ó vida sem vida! S (15-10-54).
O seu heroísmo no sacrifício
levá-la-á a prosseguir ainda por quase 11 meses: o último diário traz a dada de
2 Setembro de 55!
Para o fim de 46 as articulações dos braços e das vértebras
desligam-se!
O Dr. Azevedo decide
intervir: prepara dois apoios em forma de S alongado, que prende aos lados da
cabeceira da cama; enfaixa estreitamente os braços da Alexandrina e liga-os
sobre os apoios de modo que a segurem passando sob os sovacos. Além disso faz
colocar duras tábuas sob o colchão e enfaixa-a em todo o corpo.
Alexandrina ficará assim até
à morte, por bem 9 anos!
Isso passa-se exactamente em
3 de Outubro, aniversário da primeira crucifixão.
(Este dia aniversário,) sem reflectir e nada combinar, ficou também a ser a
data em que o meu pobre corpo, ligado, ficou sobre umas duras tábuas.
Mas,
apesar disso, fiquei sedenta de mais e mais dor, mais e mais amor. S
(4-10-46)
Esta cama torna-se-lhe um
leito de espinhos.
Quero
ser vítima de Jesus e, porque o quero ser, é com o sorriso da alma que de boa
vontade continuo a sê-lo na minha cama de espinhos. Como estu enredada neles!
Como estou impedida do mais pequeno movimento! Quanto me ferem! S (10-7-49)
Acrescenta-se frequentemente
ainda a febre, que lhe dá a sensação
de ter a carne destruída.
O
pobre do meu corpo continua a ser, ora numas horas ora nas outras, um
esqueleto: caveira, chagas, espinhos, setas, dor e sangue.
O
que é a minha dor, só Jesus o compreende. E isso me basta. S (12-9-47)
O
martírio é sempre o mesmo, só com o aumento dos ardores da febre e dores
triturantes, dores quase insuportáveis. Que aflição!
Só
Jesus a vê e sabe compreender. S (4-11-49)
O
meu corpo frito, por dentro e por fora, parece por vezes arder num verdadeiro
inferno. Peço alívio, peço a mudança de posição para poder resistir sem
desespero.
Noutras
partes do corpo o gelo gela-me: fogo e gelo ao mesmo tempo; frio, gelo que dói,
que atormenta como fogo. S (12-3-54)
Não falta sequer a insónia, naturalmente!
Passei
uma noite de vigília. Sofri muito; não podia rezar. Só de longe a longe uma
jaculatória podia dizer. Mas estive sempre unida a Jesus e sempre era a sua
vítima. S (7-11-53)
Nas
minhas noites de vigília oro, oro, uno-me aos meus Amores, ofereço-Lhes as
minhas lágrimas, mas nada vale: é vão todo o meu esforço! S (18-3-55)
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