211. Senti,
primeiro no coração e depois passou-se ao corpo, um frio gelador: foi a morte
a avizinhar-se. Jesus expirou.
212. No
mesmo momento o segredo da morte reinou no Calvário e na minha alma.
213. O Céu abriu-se quando Jesus expirou.
Já todos, do Calvário, podíamos passar ao Céu.
214. Reconciliou-se
a Terra com o Céu: já todos podíamos viver a mesma Vida[i]:
215. Uniu-se
de tal forma o Céu com a Terra que me fez sentir e lembrar o que em pequenina
tinha visto: a massa do padeiro no cilindro[ii];
aquela roda que misturava tudo. Que movimento! A mesma massa, o Céu e a Terra!
216. Ficou
o Céu reconciliado com a Terra.
217. Um
som harmonioso encheu o Céu e a Terra.
Liberta
as almas em ânsias
218. O Calvário estava em trevas. E
eu fui descer a um lugar de trevas[iii] e
eu mesma fui a luz que tudo iluminei. Digo “eu”, mas não fui eu, porque eu
mesma sou trevas e morte. Mas foi aquela vida que viveu em mim, que triunfou no
Calvário e na cruz.
219. Desci
como que a um inferno, mas não a um inferno de fogo, de maldição e tormentos,
mas a um inferno só de tremenda escuridão, onde não entrava luz nem alegria:
era um inferno de cegueira e ansiedade. Senti como que Nosso Senhor estivesse
em mim, contente, de braços abertos, como quem se sustenta no ar entre aquela
multidão, como uma pomba batendo asas, transmitindo a mesma alegria e fazendo
com que voasse essa multidão toda. Mas como, meu Deus! Vivo e não vivo, sou eu
e não sou; estou no mundo e parti. Senti que desci a esse inferno, mas, de
novo, saí, e que, atrás de mim, levava um bando sem número de pombas brancas
que voavam atrás de mim; não digo bem, voavam esses seres que não eram corpos
atrás desse corpo glorioso.
220. Eu
senti a alegria do Céu e muitas almas.
221. Eu
senti e vi tudo e fiquei sempre mergulhada na dor, na cegueira, e na morte.
A Sua
vida divina separara-se de mim
222. Voara
a Sua alma santíssima e eu fiquei na mesma dor, a sentir a mesma perda da Mãezinha.
223. A
Sua vida divina separara-se de mim.
224. Fiquei
como se a alma me tivesse deixado e eu não tivesse vida.
225. A
mesma vida divina tinha sido sempre a força de tanta dor.
226. Jesus
tinha expirado; e eu fiquei neste arrebatamento, sem pertencer a Deus sem
pertencer à Terra.
227. A
morte de Jesus escureceu o Calvário da minha alma.
228. O
silêncio da morte reinou no Calvário da minha alma.
229. Pouco
depois vi dar a lançada em Seu divino lado.
230. Foi
dentro em mim que Ele foi alanceado.
231. O
Coração foi aberto: deu as últimas gotas de sangue,
232. o
resto do Seu preciosíssimo sangue e, por fim, gotas de água.
233. Ficaram
raios do Coração a iluminar a Terra; enquanto o sol, como que envergonhado, se
escondia entre as nuvens que estremeciam, juntamente com o solo do Calvário.
234. De
todas as Suas chagas saíam raios de luz, como sol por frestas.
“Cristo
morreu e ressuscitou para ser Senhor dos mortos e dos vivos” (Rom. 14, 9)
242. Por
entre aquelas nuvens negras da morte, rompeu Jesus; sobressaiu, foi brilhar
mais além. Venceu tudo e de tudo triunfou. Mas eu não O acompanhei naquele
vencimento, naquele triunfo, naquela luz: fiquei sempre na minha dor, amargura
e agonia. Ele foi, mas ficou sempre comigo, no meio do gozo, da luz triunfal;
unido a mim transformado em mim sofria[iv].
Queria saber falar desta separação de Jesus, para o gozo, e ao mesmo tempo, da
união dolorosa dentro em meu corpo. Mas não sei. O que sei, é que a agonia
continuou.
243.
Jesus morreu e viveu sempre. Senti que Ele morreu e sentia que Ele vivia. Ó
vida, ó vida celeste!
“Chamo-vos
com amor de Pai”
244.
De repente iluminou-se toda a minha alma, com uma luz que iluminava o
mundo.
245.
Senti como se de cima a baixo, se rasgasse um véu: Jesus apareceu-me com a
Sua luz e deu-me a Sua vida.
246.
Ressuscitou e fez ressuscitar a minha alma. Com mais luz e dor mais
suavizada, no meu coração ouvi que Ele me dizia:
-
Ouvi, filhos meus, a voz de Jesus que vos chama! Chama-vos porque vos quer,
Ouvi e estai atentos: é a hora da graça que passa! Recebei-a, reparai-a,
aceitai-a! Bato com insistência e peço com todo o ardor do meu divino Coração: —
Vinde a Mim, chamo-vos com amor de Pai.
[i] A vida divina pode ser vivida “em parte” também pelos
homens, tornados “filhos de Deus”.
[ii] Esta comparação escolhida
pela Alexandrina faz lembrar uma das parábolas do reino dos céus: a da mulher
que mistura a farinha com o fermento (Mt. 13, 33).
[iii] Aqui refere-se ao Limbo,
lugar onde os justos, mortos antes do Sacrifício redentor de Jesus, aguardavam
o momento de poder ter acesso à visão beatífica de Deus. “Ele morreu, mas o
Espírito de Deus fê-lo ressuscitar E com a força desse Espírito Ele foi
anunciar a salvação também aos espíritos que estavam no cárcere” (1 Pedro, 3,
18). A fé cristã confessa que “Jesus Cristo é o Senhor no Céu depois de ter
ressuscitado dentre os mortos” (Rom. 10, 6-10).
[iv] Em todos os tempos, em
toda a alma justa, Jesus está presente e continua a Sua Paixão.
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